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Origens e características

Caro leitor

Nesta guia você encontrará:

  • algumas das motivações para o estudo de raios cósmicos;
  • definições: radiação primária e cascata de partículas secundárias;
  • breve histórico da descoberta do múon, partícula relevante para nossas atividades experimentais.

Boa leitura!

Descobertos em 1912 pelo físico austríaco Victor Hess, os raios cósmicos são partículas relativísticas (compostas em sua maior parte por prótons e núcleos leves) produzidas por supernovas e outras fontes em nossa galáxia e além dela.

Evidências experimentais sugerem que os raios cósmicos de energia até 3×10183 \times 10^{18} eV são criados e acelerados em explosões estelares na Via Láctea. Já os mais energéticos, (milhões de vezes mais energéticos do que os prótons que são acelerados no LHC a 77 TeV = 7×10127\times10^{12} eV) devem ter origem fora de nossa galáxia.

Nota

Consulte a guia Informações Complementares / Pequeno léxico / Glossário do "Cosmic" para saber mais sobre o eV (elétron-volt).

Como os raios cósmicos alcançam energias tão altas? Onde estão os aceleradores naturais? Sabemos por exemplo, que entre os raios cósmicos de baixa energia, existem aqueles que chegam do Sol em um fluxo de partículas carregadas conhecido como vento solar, e que são responsáveis pelo espetáculo de luzes das auroras ou luzes polares que aparecem na Figura 1. A ionização e excitação resultantes dos constituintes atmosféricos em regiões de altas latitudes emitem luz de cores e complexidade variadas quando atingidas pelas partículas do vento solar. Para tons de luz azul, violáceo: interações com moléculas de nitrogênio; para tons de luz verde e vermelho: interações com moléculas de oxigênio.

Figura 1: Imagens de auroras polares no norte ("aurora borealis") e no sul ("aurora australis").

Créditos da imagem: Wikipedia - _Images of auroras from around the world, including those with rarer red and blue lights.

Nota

Consulte a guia Informações Complementares / Experimentos da atualidade para saber mais sobre como os raios cósmicos de altas energias são estudados pelas colaborações mundiais de físicos de astropartículas.

Consulte a guia Pesquisa / Como detectamos raios cósmicos para saber mais sobre os detectores e os experimentos.

A determinação da origem de partículas cósmicas de alta energia torna-se mais difícil na medida que são influenciadas pelos campos magnéticos do espaço interestelar. Para aprender sobre a natureza dos raios cósmicos de alta energia, os cientistas medem sua energia e sua direção conforme chegam do espaço. Os raios cósmicos de energia mais baixa são medidos diretamente pelo envio de detectores a alturas elevadas na atmosfera terrestre, pelo uso de balões e satélites. Para raios cósmicos de alta energia, entretanto, se torna mais eficiente explorar a formação de chuveiros atmosféricos extensos colocando vários tipos de detectores na superfície, por exemplo.

Quando uma destas partículas colide com uma molécula na atmosfera da Terra, uma cascata de partículas secundárias é gerada conforme a ilustração da Figura 2. Por exemplo, um próton vindo do espaço atinge um próton (ou um nêutron) num núcleo atômico do ar atmosférico (oxigênio ou nitrogênio). Parte da energia do próton incidente (aproximadamente 40%) se transfoma gerando novas partículas (secundárias) com suas respectivas massas e energias.

Figura 2: Interação de raio cósmico primário com a atmosfera gerando cascata de partículas secundárias.

Créditos da imagem: CERN Document Server - "Cosmic rays: particles from outer space".

A cascata de partículas secundárias, também denominada radiação secundária, é formada em sua maior parte por prótons, elétrons e múons. As interações dos raios cósmicos com os átomos da atmosfera também disparam transformações que dão origem a núcleos radioativos. Este é o caso do isótopo de carbono 14^{14}C, importante para a datação de fósseis, e que se forma em camadas superiores da atmosfera por efeito do bombardeamento de átomos de nitrogênio por nêutrons contidos nos raios cósmicos:

7_{7}N14+0^{14} + _{0}n16^{1} \rightarrow _{6}C14+1^{14} + _{1}H1^{1}

Múons penetrantes da radiação cósmica

O múon é uma partícula elementar subatômica similar ao elétron, mas mais massiva (mμ207×_{\mu} \approx 207 \times me_{e}). Produzido na atmosfera superior pelo decaimento de píons produzidos por raios cósmicos primários apresenta duas formas: uma com carga negativa: πμ+νˉμ\pi^{-} \rightarrow \mu^{-} + \bar{\nu}_{\mu} e outra, sua antipartícula, positivamente carregada: π+μ++νμ\pi^{+} \rightarrow \mu^{+} + \nu_{\mu} .

Nota

Consulte a guia Informações Complementares / Anatomia das Partículas Cósmicas / O Modelo Padrão da física de partículas para saber mais sobre o múon, partícula da segunda geração de léptons do Modelo Padrão.

O múon foi descoberto como um constituinte da cascata de partículas de raios cósmicos pelos físicos americanos Carl D. Anderson e Seth Neddermeyer em 1936. Por causa de sua massa, a princípio pensou-se que fosse a partícula prevista pelo físico japonês Yukawa Hideki em 1935, para explicar a interação forte que mantém prótons e nêutrons unidos no núcleo. Posteriormente descobriu-se que o múon pertence ao grupo de partículas subatômicas denominadas léptons, que não reagem com o núcleo ou com outras partículas através da interação forte. Os múons são relativamente instáveis, com um tempo de vida de 2,2×106\approx 2,2 \times 10^{-6}s antes que decaiam, via interação fraca, em um elétron e dois tipos de neutrinos (eνeˉνμe^{-}\bar{\nu_{e}} \nu_{\mu}). Fonte: The Review of Particle Physics (2022) - Particle Data Group Summary Tables.

Por causa de sua carga elétrica, antes de decairem, os múons perdem energia deslocando elétrons dos átomos do ar atmosférico (ionização). Contudo, como viajam em velocidades próximas à da luz, o processo de ionização dissipa a energia em quantidades relativamente pequenas, garantindo que os múons possam ainda viajar atravessando a superfície da Terra. Este comportamento dos múons penetrantes da radiação cósmica confirma o fenômeno de dilatação do tempo previsto por Einstein na formulação da teoria da relatividade especial.

Suponha que um múon seja produzido pelo decaimento de um píon a 20 km da superfície da Terra. Considerando que o múon viaje à velocidade da luz, com um tempo de vida de 2,2×1062,2 \times 10^{-6}s, este viajaria 3×108×2,2×106=6603 \times 10^{8} \times 2,2 \times 10^{-6} = 660 m, não alcançando assim, a superfície da Terra. Mas então como os múons atingem a superfície da Terra? Segundo formulação de dilatação do tempo que Einstein propôs, o tempo passa mais devagar para um múon que se desloca próximo à velocidade da luz do que para um múon em repouso. Como resultado, o múon que se move a velocidades relativísticas pode alcançar a Terra. Você vai comprovar isso com o nosso detector Cosmic!